Dois
antigos trabalhadores da extinta Brasil Telecom, hoje Oi, conseguiram garantir
o pagamento de participação nos lucros para aposentados, previsto em cláusula
da convenção coletiva de 1969, que não teria sido expressamente revogada em
negociações posteriores.
Os
ministros do órgão máximo do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a Subseção I
Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), aplicaram ao caso a nova
redação da Súmula nº 277, alterada em setembro.
O
texto diz que os benefícios concedidos aos trabalhadores passaram a integrar os
contratos individuais, serão automaticamente renovados e só revogados se houver
uma nova negociação.
Se
esse entendimento prevalecer nas próximas decisões da Corte, o impacto sobre as
empresas poderá ser imenso, segundo advogados trabalhistas. Isso porque as
companhias terão de pagar aos trabalhadores que entrarem na Justiça valores
referentes a benefícios antigos, não expressamente cancelados.
Apesar
desse julgamento, há ministros no TST que entendem que esse novo entendimento
só poderá ser aplicado nas novas convenções e acordos coletivos, firmados após
setembro deste ano, quando a súmula foi modificada. Essa solução é conhecida no
meio jurídico como modulação dos efeitos e poderia diminuir o impacto dessa
alteração.
É
o caso da 4ª Turma, onde os ministros foram unânimes ao decidir a favor da
Ferrovia Centro Atlântica, sucessora da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), hoje
Vale. No processo, um ajudante de maquinista pedia a manutenção de parcela,
suprimida pela RFFSA em 1999, relativa a horas de viagem, previstas em uma
antiga norma regulamentar que não teria sido cancelada.
Segundo
o relator do processo, ministro Vieira de Mello Filho, a alteração da
jurisprudência "deve ser sopesada com o princípio da segurança
jurídica". Isso porque a Corte alterou significativamente seu entendimento
ao revisar a súmula.
Nos
últimos 24 anos, o entendimento do próprio TST foi o de que as vantagens
negociadas entre empresas e trabalhadores valeriam enquanto vigorasse o acordo,
no prazo máximo de um ou dois anos, conforme a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT). Para mantê-los em uma próxima convenção era necessária nova
rodada de negociação.
O
advogado, professor de direito do trabalho da USP e membro do Conselho Superior
de Estudos Jurídicos da Fecomercio, Cassio Mesquita Barros, afirma que o
tribunal ratificou a súmula nesse julgamento da SDI-1.
"O
que é uma flagrante ilegalidade, já que não existem cláusulas eternas, conforme
prevê a própria CLT ao dar validade máxima de dois anos a esses acordos",
diz. Para ele, essa interpretação é "muito perigosa" e pode ter um
impacto enorme sobre as empresas. Porém, segundo Barros, "as companhias
farão uma campanha ferrenha contra a aplicação desse texto".
A
Fiesp encaminhou ao presidente do TST uma representação contra essa súmula e
outras editadas recentemente. A Corte, no entanto, ainda poderá mudar esse
posicionamento, pelo menos com relação à aplicação dessa súmula a casos
anteriores. "Até porque muitos dos ministros não concordam com essa
aplicação", afirma Barros.
Como
no caso analisado pela Subseção I, a nova redação da súmula foi imediatamente
aplicada sem que houvesse qualquer discussão, a advogada Carla Romar,
professora de direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP), também levanta a possibilidade de que os ministros possam tratar do
tema com mais profundidade em outros julgados.
Isso
poderia ocorrer porque a relatora, ministra Delaíde Miranda Arantes, apenas
manteve a decisão da 2ª Turma contra a Brasil Telecom por entender que estaria
em sintonia com a nova redação da Súmula 277 do TST. Sem oposições, os
ministros não conheceram o recurso por unanimidade.
Para
Carla, se as turmas começarem a julgar pela não aplicação da súmula nas
convenções ou acordos antigos, a discussão poderá ser novamente suscitada na
SDI-1, responsável por uniformizar o entendimento sobre o tema. A advogada
relembra que a alteração da Súmula nº 277 teve votação acirrada entre os ministros.
Foram 15 votos a favor da nova redação e 11 contra.
O
texto ainda foi aprovado sem que houvesse precedentes, requisito necessário,
conforme o regimento interno do TST. Já para as próximas convenções e acordos
coletivos, a advogada afirma ter diversas palestras agendadas para o ano que
vem sobre o tema. "Muitas companhias já não vão querer dar novos
benefícios."
O
juiz do trabalho Rogério Neiva Pinheiro também acredita que a SDI-1 ainda possa
retomar o tema e ao menos modular a aplicação da súmula. Apesar de ainda não
ter julgado ações sobre essa questão após a edição do novo entendimento, Neiva
afirma que está preocupado com o número de litígios que possam surgir, caso não
haja uma limitação pelo TST. "Os advogados podem fazer um levantamento dos
benefícios que foram perdidos e pleiteá-los na Justiça", diz.
Procurada
pelo Valor, a assessoria de imprensa da Ferrovia Centro-Atlântico informou que
a empresa prefere não se manifestar. A assessoria de imprensa da Oi não
retornou até o fechamento da edição.
Fonte:
Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 07.12.2012